sexta-feira, 27 de junho de 2008

Não Estou Lá

(I'm Not There, 2007, Todd Haynes)

Todd Haynes já demonstrou muita habilidade em conduzir narrativas fragmentadas (e com temas em comum) em seu ótimo trabalho de estréia, Veneno, mas em Não Estou ele consegue atingir algo muito próximo da perfeição. O retrato que elabora do maior músico do século passado é, como já foi dito por inúmeras outras pessoas (se você não quiser ler mais um texto babando o filme, sugiro que dê meia-volta), consegue ser completo justamente por ao mesmo tempoa elaborar um estudo minucioso sobre a figura de Dylan e ainda favorecer o enigma que cerca toda a sua vida, sem apontar explicações redondinhas, um registro assumidamente imaginativo e nunca superficial.

O artista aqui se apresenta em constantes transformações e crises existenciais e justamente o mais fascinante é como Haynes magistralmente intercala diversas fases do cantor, sempre encontrando um ponto de ligação entre elas, não importando a época em que os personagens estejam: o Bob Dylan garoto, interpretado por Marcus Carl Franklin (um achado, perfeito no papel – e sob o nome de Woody Guthrie, certamente a maior influência do cantor em sua fase inicial), em certa cena, por exemplo, parece sumir no fundo do mar, engolindo por uma baleia, aparecendo ainda nesta seqüência a maravilhosa Charlotte Gainsbourg (ô mulher linda, minha nossa...) acena para o garoto, como se estivesse se despedindo daquele que viria a ser o seu marido ausente do meio dos anos 70 (no filme ela é a esposa de Heath Ledger, o Dylan da época de Blood on the Tracks); ou então quando Billy the Kid, vivido por Richard Gere (ator que geralmente é muito ruim, mas aqui sua atuação é precisa), o Dylan já mais experiente e reflexivo, isolado, em contato com suas raízes, vê o próprio Franklin sendo expulso de um bar, encarando o garoto, e, consequentemente, acaba por observar seu passado (mas afasta a cabeça logo após um “aviso” do narrador). Um outro momento do mesmo gênero que merece atenção é uma também protagonizada por Marcus (talvez o personagem-chave da trama, junto com o do Gere), quando o menino, ainda grande admirador da música feita pelos primeiros cantores folk, é confrontado por uma mulher (isso ainda no início do filme), que questiona o por quê do garoto não realizar canções que relatariam assuntos mais contemporâneo e sociais; e é aí que nasce Jack Rollins, o personagem de Christian Bale, o Bob Dylan-cantor de protesto, o “porta-voz de uma geração”, títulos que a persona, o Bob Dylan da fase rock and roll (aqui sob o nome de Jude Quinn, interpretado por uma fenomenal Cate Blanchett) seguinte descartaria (a cena que marca o “rito de passagem” de um personagem para outro também é impressionante). São por pequenos momentos como estes que Não Estou Lá consegue ser um trabalho puramente cinematográfico.

O filme também não consegue ser múltiplo apenas no que se refere ao modo em que apresenta as diversas vidas de seu protagonista, pois Haynes vai além: desconstroi aquela linguagem mais convencional, clássica e óbvia para pôr em prática uma narrativa que se aproxima mais de uma coisa mais vanguardista, o que me remeteu diretamente aos filmes do Godard, especialmente a obra-prima Pierrot le ou, que, assim como Não Estou Lá, consegue realizar uma passagem pelos mais diversos gêneros: o western está presente na história de Richard Gere; insere momentos cômicos (a cena com os Beatles é impagável, assim como a brincadeira com os fãs mais exaltados) juntamente com um clima onírico à Fellini na trama de Blanchett; o documentário nas partes de Bale; o drama familiar intimista protagonizado por Ledger; entre muitos outros.

O brilhantismo de Haynes aparece também em outro ponto: a escolha das músicas, estabelecendo um elo perfeito entre as letras das canções de Dylan com o que está acontecendo na tela. Pode-se até dizer que o filme talvez não me tivesse deixado boquiaberto desde o seu início caso não tocasse “Stuck Inside a Móbile with the Memphis Blues Again” na abertura, ou então que duas certas cenas envolvendo Ledger e Gainsbourg não seriam um dos momentos mais lindos do filme caso não tivessem “I Want You” ou “Idiot Wind”, sem falar daquela espécie de “viodeclipe dentro do filme” de Ballad of a Thin Man, minha canção favorita do mestre (e todas as outras que citei também figuram entre as minhas prediletas). Ajudam a compor o clima, mas simplificar os méritos do longa a isso me parece um equívoco dos grandes. É, no geral, uma senhora obra-prima e certamente vocês verão “Não Estou Lá” em qualquer top 5 de melhores da década de 2000 que venha a fazer em minha vida.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

O Sonho de Cassandra

(Cassandra's Dream, 2008, Woody Allen)



Filme que confirma uma fase dramática de Allen que se distancia de seus trabalhos sérios bergmanianos feitos nos anos 70 e 80 (como Interiores e A Outra), se assemelhando mias ao excelente Ponto Final, especialmente por trabalhar com o Cinema de gênero, no caso o thriller, um estilo que apareceu recentemente até em seus filmes mais leves e cômicos, como Scoop. Explora tema já bastantes característicos do cinemasta, como o crime, o castigo e a culpa, mas o que distingue O Sonho de Cassandra de outros trabalhos de Allen é que a abordagem aqui é ainda mais densa, sufocante e amarga, sem nenhum elemento que possa suavizar a trama, puramente trágica (e tudo isso feito do modo mais contido possível).

Outro ponto que certamente é um dos grandes diferenciais de Cassandra é a classe social de seus personagens, e o que acaba por os destruir é justamente a obsessão em ascender na pirâmide social. Era uma característica que já estava presente no Jonathan Rhys Myers de Ponto Final, mas, se aquele conseguia concretizar seu objetivo, os de O Sonho de Cassandra parecem sempre frustrados. O de Ewan Macgregor, por exemplo, pega emprestado carros da oficina mecânica do irmão para tentar impressionar mulheres e essa necessidade de manter as aparências (às vezes para disfarçar a falta de caráter) atinge a grande maioria dos personagens em cena (pra não dizer todos).

Outro que cabe muito bem nessa categoria é aquele interpretado por Tom Wilkinson, o Tio Howard, tratado pela família como uma espécie de homem perfeito. Mas logo entra em cena, já conhecemos a sua verdadeira faceta. Já o personagem de Colin Farrell representa o lado humano, aquele com o espectador certamente se identificará mais e é impressionante como a atuação de Farrell consegue se mostrar eficiente ao nos mostrar toda a fragilidade do estado psicológico de seu personagem (especialmente na segunda parte do filme, porque anters eu o acho realmente irritante). É sem dúvida um belíssimo filme, e certamente entre os mais subestimados de Allen

sábado, 21 de junho de 2008

Um "pouco" sobre Fim dos Tempos



Não sei se vou conseguir formular um texto mais formal sobre, até porque ainda estou processando minhas idéias a respeito (a maioria do que será dito aqui, portanto, será besteira), mas adianto que isso aqui é o encontro perfeito entre Os Pássaros e Vampiros de Almas. Shyamalan mostra com Fim dos Tempos que não faz Cinema pra tentar converter críticos ou público (tendo em vista que em menos de 10 anos ele passou da maior promessa de Hollywood a um dos cineastas mais detratados do meio - mas com um grupo sólido de fãs, e vocês podem me incluir nesse), mas faz um trabalho extremamente coerente com os rumos que sua carreira tem tomado, um Cinema autoral mesmo, quer queira ou não.

É muito interessante observar também como Fim dos Tempos representa para Shyamalan um total desligamento daquele Shyamalan de início de carreira, com o seu Sexto Sentido. Não faz muito tempo que ele era meio que cobrado por "finais surpreendentes" (algo que acabou mais ou menos na época do A Vila, acho), mas aqui ter uma conclusão impactante não parece ser a principal atenção, até porque em certo ponto Fim dos Tempos se mostra até um tanto anti-climático, com as nossas expectativas sendo frustradas em alguns momentos (apesar de também inúmeros momentos de surpresa). O que me parece ser o foco de Shyamalan é, na verdade, compor esse painel completamente caótico sobre o mundo moderno (talvez o cineasta que melhor conseguiu traduzir esse estado crescente de desespero), visão que já estava presente de modo não tão direto em A Vila ou A Dama na Água, mas que aqui atinge seu máximo. Sempre por trás desse cinema voltado para a catástrofe e com comentário socio-políticos, há, é claro, a estória de uma família, dessa vez tendo um casal em crise como foco. É sobre paranóia e isolamento feito nos moldes das produções B clássicas (como o já citado Vampiros de Almas) com alguns pontos em que isso fica mais evidente, como a mais uma vez excelente trilha sonora do James Newton Howard (em A Vila, criou um clássico) e também no tom das atuações. Aliás, este aspecto tem sido um dos mais criticados, mas a única que realmente parece deslocada é mesmo a Zooey Deschanel, e creio que o problema não é só dela, mas também do próprio modo como sua personagem foi concebida (um erro que não tira de modo algum o brilho de Fim dos Tempos). Quanto ao Mark Wahlberg, é um ator que me surpreende cada vez mais, e, sim, está ótimo em cena.

Deve ser também o primeiro Shyamalan a ter não apenas a representação do horror psicológico, como também o físico. Há uma quantidade considerável de sangue e, meu Deus!, como ele filma bem aquelas cenas de ação! De longe, o seu trabalho mais seco, perturbador, angustiante. É algo que fica ainda mais evidente com a chegada do terceiro ato, que já me chegou a lembrar o também excelente Possuídos, do William Friedkin, talvez devido ao confinamento dos personagens na casa de uma velhinha. Tudo isso marca talvez uma nova fase para Shyamalan (cada vez mais se aproximando de ser um cineasta "maldito"), o fim de uma "era PG-13", com Fim dos Tempos representando um dos pontos mais altos e relevantes da curta carreira de nosso indiano favorito (quer dizer, o meu e de mais uns).

sábado, 14 de junho de 2008

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Top 20 Anos 2000

Lista que fiz para o ranking dos anos 2000 da Liga dos Blogues Cinematógraficos, com os meus 20 favoritos filmes dessa década, até agora.

01. Embriagado de Amor (Punch-Drunk Love, 2002), de Paul Thomas Anderson
02. Não Estou Lá (I'm Not There, 2007), de Todd Haynes
03. Encontros e Desencontros (Lost in Translation, 2003), de Sofia Coppola
04. Elefante (Elephant, 2003), de Gus Van Sant
05. O Novo Mundo (The New World, 2005), de Terrence Malick
06. Os Excêntricos Tenenbaums (The Royal tenenbaums, 2001), de Wes Anderson
07. Império Dos Sonhos (Inland Empire, 2006), de David Lynch
08. As Coisas Simples da Vida (Yi Yi, 2000), de Edward Yang
09. Reis e Rainha (Rois et Reine, 2005), de Arnaud Desplechin
10. Cidades dos Sonhos (Mulholland Drive, 2001), de David Lynch
11. Mal dos Trópicos (Sud Pralad, 2004), de Apichatpong Weerasethakul
12. Kill Bill Vol.2 (2004), de Quentin Tarantino
13. A Ultima Noite (The 25th Hour, 2002), de Spike Lee
14. Sobre Meninos e Lobos (Mystic River, 2003), de Clint Eastwood
15. Femme Fatale (2002), de Brian DePalma
16. Marcas da Violência (A History of Violence, 2005), de David Cronenberg
17. No Direction Home: Bob Dylan (2005), Martin Scorsese
18. A Vida Marinha com Steve Zissou (The Life Aquatic..., 2004), de Wes Anderson
19. Onde os Fracos Não Tem Vez (No Country for Old Men, 2007), de Joel e Ethan Coen
20. A Menina Santa (La Niña Santa, 2004), de Lucrecia Martel

Quase entraram:

Last Days, de Gus Van Sant; Lúcia e o Sexo, de Julio Medem; A Vila e A Dama na Água, de M. Night Shyamalan; Demonlover, de Olivier Assayas; Luz Silenciosa, de Carlos Reygadas; O Quarto do Filho, de Nanni Moretti; Amor à Flor da Pele, de Wong Kar-Wai.



sexta-feira, 6 de junho de 2008

Lost: A Quarta Temporada

(2008)



AVISO: TEXTO COM SPOILERS!!!!!

Finalmente chegou ao fim a possivelmente mais polêmica temporada de Lost, a sua quarta, que deixou muitos fãs divididos, especialmente devido à grande mudança de ritmo e estilo na sua narrativa, comprovando que esta aqui é acima de tudo uma temporada de transição. Desta vez, ao contrário do que ocorreu nas anteriores, o caminho até a Season Finale (que comentarei mais a fundo em seguida) foi menos tortuoso, mais curto e regular; houve bem menos episódios abaixo da média (creio que apenas dois), os pontos mais altos também não foram tão grandes (lembrando que estamos falando de uma série que, quando ainda possuía 24 episódios ao invés de 14, conseguia em sua parte final nos entregar um bom número de episódios geniais consecutivos). Ainda assim, aqui tivemos o excelente “The Shape of Things to Come” (do Ben) e a pequena obra-prima protagonizada pelo Desmond, The Constant, além, é claro...

...Das três partes que compuseram esta Season Finale, There’s No Place Like Home. A primeira serviu como uma bela introdução para o que iria acontecer nos dois capítulos seguintes, provavelmente o mais épico de todos os episódios da série. Ok, certamente não foi tão violento ou inovador como foi vendido por aí (ao menos para mim, mente doentia que esperava uma chacina à Kill Bill), mas o que teve de tensão e emoção não foi pouco, mesmo. Os conflitos pessoais aqui chegam ao seu máximo, com conclusões grandiosas. Muito difícil não ficar comovido com cenas como a despedida entre Kate e Sawyer, a explosão do barco ou o encontro entre Desmond e Penny. Impossível deixar de falar também da já clássica cena da ilha se movendo ou do destino do Locke, personagem que no início da temporada foi sendo meio que deixado de lado, mas que comprovou agora ser um dos mais importantes da série (o meu sonho de vê-lo se transformar em uma espécie de Coronel Kurtz parece se concretizar).

Agora, é só esperar até janeiro (pouco tempo, não?), e, mesmo tendo muito medo dos rumos que a série poderá tomar, prometo não reclamar caso a quinta temporada tenha uma season finale tão fantástica com essa.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Filmes de Maio

Sei que o blog nesses últimos dias ficou meio parado (ficar postando videos é picaretagem, convenhamos), mas vou tentar organizar melhor os meus textos para publicar por aqui. Prometo que publico meu texto sobre a 4ª temporada de Lost em breve, e gostaria de fazer o mesmo com os comentários sobre Margot e o Casamento e Zabriskie Point (escrevi no caderno, já que, afinal, eu não tenho muito o que fazer durante as aulas, sabe?). Enfim, taí:



TOTAL: 18 filmes


Underground
(1995, Emir Kusturica) - * * * *
Confiança (Trust, 1990, Hal Hartley) - * * *
Transylvania (2005, Tony Gatlif) - * * *1/2
O Balão Branco (Badkonake Sefid, 1995, Jafar Panahi) - * * *1/2
Mutum (2007, Sandra Kogut) - * * *1/2
Margot e o Casamento (Margot at the Wedding, 2007, Noah Baumbach) - * * * *
Os Indomáveis (3:10 to Yuma, 2007, James Mangold) - * * *1/2
Na Natureza Selvagem (Into the Wild, 2007, Sean Penn) - * * *
Contos de Nova York (New York Stories, 1989, Martin Scorsese[**], Francis Ford Coppola[**] e Woody Allen[***]) - * *
Os Sapatinhos Vermelhos (The Red Shoes, 1948, Michael Powell and Emeric Pressburguer) - * * * * *
Zabriskie Point (1970, Michelangelo Antonioni) - * * * *
Lady Chatterley (2006, Pascale Ferran) - * * * *
Indiana Jones e O Reino da Caveira de Cristal (Indiana Jones and the Kingdom of the Crystal Skull, 2008, Steven Spielberg) - * *1/2
As Confissões de Henry Fool (Henry Fool, 1997, Hal Hartley) - * * *1/2
Finis Hominis (1971, José Mojica Marins) - * * *
Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver (1967, José Mojica Marins) - * * * *
Speed Racer (2008, Wachowski Bros.) - * * *
Souhtland Tales (2006, Richard Kelly) - * * * *

Séries:

Six Feet Under: A Primeira Temporada (2001, Allan Ball) - * * *1/2
Lost: A Quarta Temporada (2008) - * * * * [Season Finale: * * * * *]