segunda-feira, 27 de abril de 2009

Um Conto de Natal



O que mais me veio à cabeça ao ver este Um Conto de Natal é que ele é tudo o que O Segredo do Grão, do duas vezes vencedor do César Abdel Kechiche, queria ter sido. Não quero me aprofundar muito nessa comparação, porque elas geralmente são bem chatas, mas existem evidentemente alguns pontos em comum partilhado entre esses dois filmes, como o fato de ambos se interessarem em explorar as relações familiares e por aparentemente se alongarem sem motivo. Digo "aparentemente" pois acho que é um problema que atinge muito mais o trabalho de Kechiche que o de Desplechin (que há cinco anos fez a obra-prima Reis e Rainha). Em O Segredo do Grão há a necessidade de se criar uma espécie de épico familiar, enchendo linguiça com algumas que ao meu ver se alongam desnecessariamente, parecendo que o diretor teve que criar cenas adicionais para que o trabalho chegasse a tal duração, enquanto Um Conto de Natal se prolonga de um modo muito mais natural, com uma narrativa fluida (quase jazzística) que faz com que a duração dificilmente seja sentida (será que sou o único que poderia passar mais uma hora dentro do cinema acompanhando aqueles personagens??), e também porque o Desplechin possivelmente o escreveu/filmou tão excitadamente que acabou perdendo o controle do material. Sim, talvez seja uma obra um pouco descontrolada e gorda (apesar de que a montagem parece dar conta de tudo), mas tá bom demais do jeito que ficou: um registro vivo e extremamente caloroso e complexo dos relacionamentos humanos, valorizando e se aprofundando em cada um daqueles personagens (outro motivo pelo qual o filme precisa se alongar um pouco), fugindo de todo tipo de clichês que geralmente dominam filmes sobre "famílias desestruturadas" (todo diretorzinho indie devia ter esse como filme de cabeceira). Dificilmente seria tão bom se não tivesse um elenco gigantesco por trás: além de Catherine Deneuve, temos Mathieu Almaric, gênio e melhor ator de sua geração, Chiara Mastroianni, Emmanuelle Devos e belas performances de Melvin Poupald (o cara do O Tempo que Resta) e principalmente de Anne Consigny (que interpreta a filha mais velha), que já atuou com Almaric em O Escafandro e a Borboleta. Grande filme mesmo.

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